Por que a indústria de gás natural de Moçambique é um divisor de águas?
Moçambique está se transformando em um dos protagonistas globais no setor de energia, graças às suas vastas reservas de gás natural. Com descobertas recentes na Bacia do Rovuma e investimentos bilionários, o país africano não só impulsiona sua economia, mas também redefine o futuro energético mundial. Neste artigo, exploramos os fatores que fazem desse setor um divisor de águas, desde a produção até os impactos socioeconômicos.
1. Reservas Colossais e Potencial de Produção
Moçambique abriga uma das maiores reservas de gás natural do mundo, concentradas principalmente na Bacia do Rovuma, no norte do país. Estima-se que a região contenha mais de 75 trilhões de pés cúbicos (Tcf) de gás recuperável, suficiente para abastecer mercados globais por décadas.
Principais Projetos em Andamento:
Projeto | Empresa Líder | Capacidade (mtpa) | Investimento (US$) | Status |
Mozambique LNG | TotalEnergies | 13 (expansão para 43) | 20 bilhões | Parcialmente suspenso |
Coral Sul FLNG | Eni | 3,4 | 4,7 bilhões | Em operação |
Coral Norte FLNG | Eni | 3,55 | 7,2 bilhões | Aprovado (abril/2025) |
Rovuma LNG | ExxonMobil/Eni | 15,2 | 30 bilhões | Planejado (FID em 2026) |
A produção atual de GNL é de 3,3 milhões de toneladas por ano (mtpa), mas o governo pretende quintuplicá-la para 20 mtpa até 2029, conforme o Plano Quinquenal 2025-2029. A Eni, por exemplo, já celebrou a marca de 5 milhões de toneladas produzidas no projeto Coral Sul FLNG em 2024.
2. Impacto Econômico e Social
O gás natural já é o segundo maior produto de exportação de Moçambique, atrás apenas do carvão. Em 2024, as exportações atingiram US$ 1,467 bilhão nos primeiros nove meses, um aumento de 24,6% em relação a 2023. No primeiro trimestre de 2025, as vendas somaram US$ 443 milhões, apesar da queda de 43,5% nos preços internacionais.
Benefícios para a Economia Local:
- Geração de Empregos: Mais de 10.000 postos diretos criados durante a construção dos projetos.
- Receitas Fiscais: Expectativa de arrecadar US$ 4-5 bilhões/ano em impostos até 2030, com projeções de até US$ 500 bilhões até 2045 (FMI).
- Eletrificação Doméstica: 25% do gás será destinado ao mercado interno, incluindo a usina termelétrica de Temane (450 MW), que abastecerá 1,5 milhão de residências até 2027.
Desafios:
- Reassentamentos: Mais de 550 famílias deslocadas em Cabo Delgado sem compensação adequada.
- Dependência Externa: Apenas 15% da mão de obra nos projetos é local, segundo dados de 2024.
3. Papel no Mercado Global de Energia
Moçambique posiciona-se como um fornecedor estratégico para a Europa e a Ásia, especialmente após a crise energética pós-2022. Em 2023, 70% do GNL produzido foi exportado para esses mercados.
Vantagens Competitivas:
- Localização Geográfica: Proximidade com rotas marítimas para a Ásia e o Oriente Médio.
- Tecnologia de Baixo Carbono: Projetos como Coral Sul FLNG reduzem emissões em 30% usando plataformas flutuantes e sistemas de captura de CO₂.
Riscos:
- Concorrência Global: Países como Qatar e EUA ampliam oferta, pressionando preços.
- Transição Energética: Demanda por GNL pode cair 30% até 2040 devido a energias renováveis.
4. Sustentabilidade e Inovação Tecnológica
Apesar de ser um combustível fóssil, o gás natural é visto como uma ponte para a transição energética. Destaques incluem:
- Gas-to-Power: Integração de usinas termelétricas com parques solares.
- Hidrogênio Verde: Parcerias para produção de amônia azul no Rovuma LNG.
- Tecnologias de Purificação: Honeywell implementou sistemas de adsorção para remover CO₂ e mercúrio no Rovuma LNG.
Iniciativas em Destaque:
- Zero Flaring: Eni eliminou a queima de gás residual no Coral Sul FLNG.
- Mphanda Nkuwa: Hidrelétrica de 1.500 MW complementará a matriz energética.
5. Segurança e Estabilidade Política
A província de Cabo Delgado, epicentro dos projetos, enfrenta uma insurgência jihadista desde 2017. Ataques recentes em Nicocue e Mocímboa da Praia (2025) mantêm riscos elevados. Medidas incluem:
- Intervenção Militar: Presença de tropas de Ruanda e da SADC desde 2021.
- Financiamento EXIM: US$ 5 bilhões aprovados para retomada do Mozambique LNG em março/2025.
6. Futuro do Setor: Cenários em Jogo
Otimista:
- Expansão para 43 mtpa de GNL até 2035.
- Atração de US$ 50 bilhões em investimentos adicionais.
Cauteloso:
- Instabilidade política pós-eleições de 2024 gerou protestos e 303 mortes.
- Dívida externa de US$ 29,5 bilhões pressiona o orçamento nacional.
Conclusão
Moçambique está na vanguarda da revolução energética africana. Com reservas gigantescas, parcerias internacionais sólidas e potencial para transformar sua economia, o país pode se tornar um exportador global de GNL na próxima década. No entanto, o sucesso depende da resolução de desafios internos, como segurança e equidade social, e da adaptação a um mercado global em transição.